domingo, 17 de abril de 2016

O agonizar do Brasil

No dramático combate de Curupaiti na Guerra do Paraguai, caído ao chão e ensanguentado, um combatente aliado foi acudido e perguntado sobre seu estado, quando respondeu: “não é nada, apenas um braço a menos; a pátria merece mais”.

Não pode haver irresignação maior que a do idealista que, em nome de uma convicção, renega os anos de sua juventude, sua liberdade e por vezes sua própria vida. Cada vez mais raro, é verdade, mas ainda assim ele é o responsável por não deixar fenecer a moribunda flâmula da liberdade, que é, sim, o único bem pelo qual se vale a pena morrer.

Sobre ele, Agassiz Almeida, abalizado pelas marcas em si deixadas pelas garras da ditadura, já vociferou: “Quem é o idealista? O irrequieto nunca vencido a dormitar na utopia de todos os revolucionários, que sofre, luta, ri, chora e quer construir novos mundos”.

Esperamos, porém, que exemplos drásticos de heroísmos não sejam necessários hodiernamente, pois todo o sangue e lágrimas vertidos pelos séculos já deveriam ter lavado as máculas do voluntarismo despótico e da autofagia social. Ressente-nos, porém, quando os olhos ensandecidos do autoritarismo nos encaram com seu terror.

Esses olhos dirigiram hoje um processo que estrangulou, à vista do mundo, o pendão púbere da democracia brasileira, e em meio a um espetáculo pueril e ameaçador, viu-se a ribalta de sorrisos, gargalhadas, performances e o despudor da troca de personas, por vezes constrangidas, por vezes ameaçadoras, descortinar a perfídia dos que se interessam em representar apenas a si mesmos: cenas irracionais de um teatro de guerra que, sim, mutilou um dos membros do corpo ainda em desenvolvimento da nossa democracia.

Cambaleante e agonizante, o Brasil sofre novamente o martírio da interrupção de seu desenvolvimento em nome dos interesses tacanhos de tenebrosas transações firmadas pelos carrascos do progresso. E é assim que observo o gigante já exausto, desanimado, esmorecido de tantas extirpações, de tantas interrupções, que o impõem sempre que ensaia se reerguer nos seus poucos séculos de vida sobre o alicerce da democracia.

O alemão Carl Schmitt já asseverou que o soberano é quem decide sobre o estado de exceção, e o antagonismo político, que fundamenta tal pensamento, ficou bastante claro quando observamos o Estado Material de Direito ser solapado por uns poucos que suspenderam toda e qualquer norma para infligir seus preocupes em detrimento do povo.

A pulsação democrática, de tão intermitente, já quase não se ouve, e com o sangue ainda fresco dos mortos no golpe da ditadura de 1964, querem ferir de morte ainda tantos outros. Em seu leito, os carniceiros aguardam seu perecimento.



A sombra da figura funesta já se avoluma sobre o solo pátrio. Mas esquecem, no entanto, que a morte é grande amiga dos que não a temem, e será essa a única possibilidade de desfibrilar o país, com a irresignação dos idealistas que com ela se unirão, se preciso for.

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