quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Clóvis Júnior e Arte Naif


Há alguns anos minhas raízes nordestinas emergiram à minha epiderme. Isso porque por muito tempo dava atenção quase que exclusiva à música britânica, americana, ou mesmo quando nacional, sem especial interesse pela música nordestina. Mas chega um tempo que o que sempre foi passa a ser, e meu sentimento telúrico falou mais alto. Não posso negar que a poesia foi grande responsável, seguida pela música, o forró pé de serra, que acho simplesmente maravilhoso, até pela delicadeza e sensibilidade que imprimem, contrariando um pouco o sertanejo euclidiano. Ora, o que é ser mais sensível que, diante de todas as dificuldades para suprir as necessidades vitais básicas, que tanto calejam o espírito de um homem, apesar disso, ainda um sertanejo ter a coragem  - talvez coragem - de dizer versos do tipo: “ela nem olhou pra mim, passei horas no espelho me arrumando o dia inteiro e ela nem olhou pra mim”, “você bagunçou meu coração, tirou ele do peito e sacudiu pela calçada”, ou ainda o tino de comparar a felicidade com uma burrinha, entre outras.

Sem falar ainda no que, para mim, é a maior das artes, o que prova que um sujeito é verdadeiramente gênio: o repente. Certa vez fui assistir a um concurso de repentistas, e saí de lá muito mais do que impressionado. Nunca havia assistido a um concurso desses, então fiquei lá, quietinho, assistindo... Foi uma experiência um tanto quanto depressiva para alguém que, como eu, ainda arrisca fazer alguns versos. Eu passo, no mínimo, horas para escrever um soneto, com rima e métrica. Os caras faziam de improviso coisas geniais, o sorteio do tema e do estilo de versos eram feitos na hora  (martelo agalopado, Galope à beira mar, redondilha, décima, carretilha, etc.). Para se ter uma idéia, o galope à beira mar, por exemplo, tem esquema rímico próprio (ABBAACCDDC), e deve ser obedecido pelo poeta... de improviso.
Pois bem, isso tudo pra dizer que nessa mesma época participei de um evento na cidade de Guarabira, e tive a oportunidade de conhecer o artista guarabirense Clóvis Júnior. Na ocasião, consegui adquirir um livro sobre o seu trabalho. Cheguei em casa fui ver do que se tratava. Sabia que ele era muito conhecido mundo a fora, mas não conhecia seu trabalho. Eis minha surpresa quando vejo que é adepto da chamada Arte Naïf, ou Arte Primitiva Moderna, que é a arte executada por artistas sem formação acadêmica, o que não significa que seja a arte Naïf, em si, uma arte menos complexa, bela,ou de menor qualidade, tendo em vista a necessidade de estudo, pois presume o conhecimento da arte dita acadêmica para o seu “não seguimento”, a sua “não execução”, sendo assim um contraste no proceder artístico.
O que Clóvis Júnior faz com maestria é conjugar esses elementos Naïf com a cultura nordestina de raiz, com grande influência da xilogravura, e feito de uma forma belíssima. Beleza e crítica social. As referências passam pelas feiras, pelas festas, pescarias, religiosidade e costumes do nordeste brasileiro.
Em 1993, Clóvis Júnior participou do 1º Concurso Nacional de Cartazes criado pela ONU, com o tema “As drogas e o nosso futuro”. Logrou a primeira colocação, tendo sido esse trabalho divulgado em todo o Brasil e em vários países da Europa, onde a Arte Naïf é muito valorizada. Além disso, foi condecorado com várias comendas e honrarias no Brasil e no exterior, participando, ainda, de exposições individuais e coletivas em Portugal, Estados Unidos, França, Inglaterra, Argentina, Itália e Alemanha.
No mais, deixo para a sensibilidade sertaneja de cada um, o site de Clóvis Dias Júnior. http://www.clovisjunior.com.br/

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