segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Viva lá crónica!

Se há o risco de um dia eu ser interditado por prodigalidade será em decorrência dos livros. Entra São João, sai natal, e sempre frustro os apelos da minha mãe para comprar as roupas das festas. Faço a conta mental do quanto gastaria, compro uma camisa e com o resto compro a coleção de José Lins do Rêgo.
A preocupação é que o ritmo das leituras não acompanha o das aquisições. E há sempre uma fila de livros me esperando para lê-los. Por isso meu temor da interdição civil. Compro cinco livros e intercalo a leitura de cada um dos cinco com a compra e leitura de outros. E adeus meus recursos.
Ainda tenho o agravante de não querer qualquer edição. Livro de bolso? só se não houver outra. Minha preferência é pelas edições mais especiais, como uma belíssima de Raízes do Brasil com capa em tecido que comprei e ainda não li. Capas duras quase me excitam sexualmente. Com os CDs e DVDs mesma coisa. Sou daqueles que não jogam as caixinhas de papelão que vêm com as coletâneas.
Mas ultimamente tenho lido crônicas. E meu comportamento mudou. 
Uma das minhas últimas aquisições foi um livro do Rubem Braga... de bolso. Dois livros em um. Vira-vira Saraiva, lê-se a partir da capa um livro, e na metade já é outro, mas de cabeça pra baixo, aí é só ir para a contracapa (que é na verdade a outra capa do outro livro) virar e ler. Nunca faria isso com o Ariano Suassuna. Talvez seja poque a leitura da crônica é mais rápida, menos solene. Não se ler o livro, mas sim as crônicas. Ler uma crônica de um livro já é ler um todo. Ler um capítulo de um romance só te dar a sensação de ser preguiçoso.
Mas não faria não por achar o Ariano superior ao Braga. Jamais. Mas é que é como se para ler um romance tivesse que estar vestido com camisa polo ensacada em uma calça excepcionalmente engomada. Crônica se ler com uma camisa do Led Zeppelin com um furo embaixo do braço. Crônica é mais de esquerda. Romance é Breaking Bad, crônica é Friends. Crônica é Almodóvar, romance é Woody Allen, para reutilizar uma outra comparação que fez Caetano Veloso. Aliás, romance é Caetano Veloso hoje, tremendo o queixo, crônica é o Caetano ontem, com tanga vermelha.
Sempre odiei emprestar seja lá o que for, ainda mais meus livros, cds e dvds. E a crônica fez surgir um sentimento inédito em minha vida: a vontade de emprestar o livro. Leio algo que gosto e fico louco para mostrar a alguém, é como se eu a tivesse escrito, e já fiz uma lista mental de pessoas que irei oferecer um empréstimo de alguns livros. Jamais ofereceria em empréstimo meu Ensaios, do Truman Capote. Pela primeira vez vivo um espontâneo altruísmo literário. Daí que a conclusão que a crônica é de esquerda, é guerrilha, é barba, é charuto e não cigarrilha. Mas gosto de charuto e cigarrilha.
Talvez as crônicas me livrem de uma interdição civil. Viva la crónica!

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